27.1.07

Ser vivido

Juntamos tantas palavras, ritmos, melodias, línguas, olhares, histórias, expressões, antiguidades, pensamentos, pares.

Tentamos entender a magia com a mente. Desligamos as personagens dos sentimentos. Procuramos algo que está em todos, em todo o lado, em todo o mundo. E, o que se encontra? Explica-se o "eu" e o "tu". O espaço que medeia as duas esferas fica por defender.

Quando esse intervalo não tem voz, não é explicado e nem se explica a ele mesmo, o que acontece? Quando não tem voz é perigoso. Quando ninguém o explica não existe. Quando não se explica, ninguém o entende. Calcular os riscos é pedir a alguém que o oiça. Ouvem-se os mudos? Ouvem-se. Vive o “eu”, o “tu” e fica por viver o “nós”.

O “eu” investe numa ginástica de acções e faz com que o “tu” tenha uma história única: “fez, disse, levou, tenciona, tentou, pensou, julgou, gritou, moveu, foi, ligou, tornou, chamou, explicou, referiu, escreveu, desculpou, roubou, mentiu, escondeu, tirou, olhou, escolheu, deu”.

Se o todo é maior do que a soma de todas as partes, o “nós” devia ser a sinergia, a união do que há de melhor, o que transparece luz, o que proporciona a paz. A Paz que tem: energia, ritmo, segredos, cor, temperatura, movimento, ar, toque, cheiro, desejo, querer, bem, sabor, lembrança, troca, entrega, textura, telepatia, silêncio, sinais, empatia.

A mão tocou-o. O corpo vibrou ao seu ritmo. O vento que sopra dobrou ramos fortes, seguros por uma terra partilhada por um mundo, em que alguns semeiam árvores, outros nunca vêm os raios da estrela que pode guiar.

Os olhos não o viram, mas os olhos viram-se. Nessa linha de ligação há um encanto desmedido, cria-se uma rede de protecção, dá-se o ombro como abrigo.

O sabor prova quem deixa os braços penderem, a curva normal se fazer, concede o poder do perdão, a versão umbilical toma lugar, e tudo pode acontecer.

Ouve-o quem escuta a sua expressão, leva consigo a atenção, liberta-se da pressão, esquece por momentos um mundo com um padrão.

E a música toma lugar. Uma linha horizontal, estendida e sem um fim, traçada por quem vence o medo de um dia se poder dar mal.

Mas o poder da ilusão é maior do que essa recessão. Atravessa gerações, ideais por provar, princípios imaginados. A entrega é maior do que a imensidão.

Quem na corrente cai, boiando com um sorriso, com cara de parvo de tanto perdido, testa um limite desconhecido, acaba bêbado, como todos vai morto, mas vivido!

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